Na
periodização de longue duré brasileira, a eleição de Luiz InácioLula da
Silva para a Presidência da República, ancorada na excepcional performance do
Partido dos Trabalhadores e de uma ampla frente de esquerda, tem tudo para ser
uma espécie de quarta refundação da história nacional, isto é, um marco de não
retorno a partir do qual impõem-se novos desdobramentos. […]. É tarefa das
classes dominadas civilizar a dominação, o que as elites brasileiras foram
incapazes de fazer. O que se exige do novo governo é de uma radicalidade que
está muito além de simplesmente fazer um governo desenvolvimentista.(Oliveira,
2003, p. 3).
Em
relação às políticas educacionais da presente década, uma análise antinômica que
trabalhasse com base na continuidade ou descontinuidade não seria capaz de
captar as diferenças de contexto e o alcance delas em relação ao passado,
especialmente em relação à década de 1990. No entanto, numa outra perspectiva,
ao examinar as propostas de educação do bloco de forças que apoiavam a
candidatura de Fernando Henrique Cardoso e as que apoiavam a de Luiz Inácio
Lula da Silva, Luiz Antônio Cunha (1995) apresenta-nos os projetos e concepções
em disputa: enquanto as primeiras resultavam de produções de quadros intelectuais
elaboradas pelo alto para serem aplicadas na sociedade, as segundas buscavam
uma construção desde a própria sociedade.
Podemos
observar como pontos principais na educação neste período:
O Programa
Universidade para todos (PROUNI) e o Programa de apoio a planos de
Reestruturação e expansão das Universidades Federais
(REUNI), por caminhos
diversos e aparentemente contraditórios, dão conteúdo à
universidade operacional. O PROUNI criou mais de 700 mil vagas para jovens, e isso
seria fantástico se tal inclusão não fosse incorporando, ainda que de forma
enviesada, a tese conservadora de Milton Friedman que, no final da
década de 1950, defendia que o Estado desse aos mais pobres um voucher ou
uma carta de crédito para escolherem onde queriam
estudar.
O
REUNI, por sua vez, representa uma inversão substantiva de recursos de custeio
para projetos e programas, quase duplicando as vagas e sendo aplaudida fortemente
pelo Manifesto dos Reitores das Universidades Públicas durante o atual governo.
Há
um último aspecto de grande abrangência que conduz a sustentar que a primeira década
do século XXI, dominantemente, foi marcada pelas concepções e práticas
educacionais mercantis típicas da década de 1990, seja no controle do conteúdo
do conhecimento, seja nos métodos de sua produção ou na socialização, autonomia
e organização docentes. Três mecanismos articulados estão em ampla expansão nas
secretarias estaduais e municipais de educação.
O
primeiro mecanismo chega ao chão da escola calcado na ideia de que a esfera pública é
ineficiente e que, portanto, há que serem estabelecidas parcerias entre o
público e o privado, mesmo mediante disfarce, quando o privado permanece
encoberto pelo eufemismo que engloba organizações sociais ou o chamado terceiro
setor. A esses institutos privados ou ONGs13 cabe selecionar o conhecimento,
condensá-lo em apostilas ou manuais, orientar a forma de ensinar, definir os
métodos de ensino, os critérios e processos de avaliação e controle dos alunos
e dos professores.
O segundo mecanismo,
decorrente do anterior, talvez o mais proclamado pela mídia,
notadamente pelas revistas semanais, é justamente o de se atacar a natureza da
formação docente realizada nas universidades públicas, com o argumento de que
os cursos de pedagogia e de licenciatura se ocupam muito com a teoria e com
análises econômicas sociais inúteis e não ensinam o professor as “técnicas do
bem ensinar”.
Esse
último aspecto define o terceiro mecanismo, condição para que os dois primeiros tenham
sucesso. Trata-se das ações de desmontar a carreira e organização docentes
mediante políticas de prêmio às escolas que, de acordo com os critérios
oficiais, alcançam melhor desempenho, remunerando os professores de acordo
com sua produtividade em termos do quantitativo de alunos aprovados.
Conclui-se
que o governo aqui relatado, teve muitos acréscimos na educação em relação aos
governos anteriores, mas como os outros governos, mas ainda não é 100%
eficiente.
FRIGOTTO, Gaudêncio. Os circuitos da história e
o balanço da educação no Brasil na
primeira década do século XXI. Revista brasileira de educação. Rio de Janeiro:
Anped. v. 16, nº 46, 2011, p. 235-254
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